A Armadilha das Reformas

Yury Moza da Costa
Estudante de Economia UFV
Membro da LANP

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O Brasil vive um momento de crise econômica, desemprego, instabilidade política, corrupção e insatisfação popular. Diante disso, fazem-se necessárias reformas de longo prazo, com o objetivo de equilibrar as contas públicas, estabilizar o quadro político e, finalmente, promover um bem-estar aos cidadãos brasileiros. Porém, boa parte dessas reformas cobra um preço sobre o curto prazo. Este texto busca outra perspectiva, através da Economia Comportamental aplicada à pobreza, sobre a baixa aceitação popular às políticas de longo prazo. A Economia possui princípios que são a base de diversos estudos e modelos que tornam esse campo de estudo tão grande quanto é. Dentre tais fundamentos, podem-se listar: 1) as pessoas enfrentam trade-offs; 2) a quantidade de bens econômicos disponíveis é escassa. Além disso, a ideia de racionalidade limitada promovida pela Economia Comportamental ilumina essa reflexão na medida em que diversos estudos (como as de Herbert Simon e Daniel Kahneman, ambos laureados com o prêmio Nobel) apontam que o homem nem sempre escolhe a melhor opção para si. 

Aplicando esse contexto acadêmico à pobreza, Mullanaithan e Shafir (2013) estudam como a escassez remodela os padrões de pensamento. “Os pobres devem administrar renda esporádica, malabarismos com as despesas e fazer difíceis trade-offs” [1]. E esse estresse que a classe mais vulnerável economicamente sofre prejudica em tarefas onde se necessita de força de vontade e autocontrole, uma vez que recursos cognitivos são, também, escassos. Isso se exemplifica através da metáfora utilizada pelos pesquisadores supracitados, “Assim como um controlador de tráfego aéreo que se concentra em um possível curso de colisão é propenso a negligenciar outros aviões no ar, os pobres, quando se preocupam com preocupações monetárias, perdem sua capacidade de dar a outros problemas sua plena consideração.” Ou seja, adiar a gratificação é mais custoso aos pobres justamente por enfrentar trade-offs mais difíceis. Além disso, vale ressaltar que a necessidade é um fator importante dessa dificuldade. Com isso, denota-se a incapacidade de imaginar consequências em longo prazo. 

No contexto brasileiro, em média, 50% dos trabalhadores recebem 15% a menos do salário mínimo [2]. Num país com elevada desigualdade de renda e taxas consideráveis de pobreza, onde 50 milhões de cidadãos possui renda equivalente a 387 reais [3], é notório que vieses cognitivos demonstrados pela Economia Comportamental se façam presentes. Por isso, deve-se questionar o impacto de tais vieses nas reformas em longo prazo. De acordo com a pesquisa dos autores citados, pode-se interpretar que, o fato de o Brasil ser pobre o leva em uma “armadilha”, influenciando negativamente na popularidade de tais políticas, o que, por conseguinte, o mantém na pobreza. Vale ressaltar que essa interpretação independe das políticas apresentadas em si e suas eficácias. O que se busca suscitar é o impacto que a escassez de bens e recursos tem no vislumbre do longo prazo e finalmente, na sua manutenção.



Referências Bibliográficas:

ÁVILA, F. e BIANCHI, A. (Orgs.) (2015). Guia de Economia Comportamental e Experimental. São Paulo. EconomiaComportamental.org. Disponível em www.economiacomportamental.org. 

MULLAINATHA, S. et al. Poverty Impedes Cognitive Function. Science. Vol 341. 6149. 976-980. Agosto de 2013. Disponível em: <https://scholar.harvard.edu/files/sendhil/files/976.full_.pdf>.


ADAMS, T. Scarcity: why having too little means so much by Sendhil Mullainathan and Eldar Shafir – review. THE GUARDIAN. 2013 Disponível em:<https://www.theguardian.com/books/2013/sep/07/scarcity-sendhil-mullainathan-shafir-review>. Acesso em 23 de Junho de 2018.

OLIVEIRA, N. IBGE: 50 milhões de brasileiros vivem na linha de pobreza. AGÊNCIA BRASIL. 2017. Disponível em:<http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2017-12/ibge-brasil-tem-14-de-sua-populacao-vivendo-na-linha-de-pobreza>. Acesso em 23 de Junho de 2018.

SILVEIRA, D. Metade dos trabalhadores brasileiros tem renda menor que o salário mínimo. G1. 2017. Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/noticia/metade-dos-trabalhadores-brasileiros-tem-renda-menor-que-o-salario-minimo-aponta-ibge.ghtml> . Acesso em 23 de Junho de 2018.  





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